Cristiana Pereira Barretto está à frente da Absolutamente Necessaire desde 2000. Ela também é parceira de Renato Imbroisi no Absoluta + RI, um projeto incrível que une design, artesanato e responsabilidade social.

Fernanda Yamamoto: Qual foi sua trajetória até a criação da Absolutamente Necessaire?

Cristiana Pereira Barretto: Tudo começou de forma inesperada durante a minha faculdade de direito na PUC. No terceiro ano do curso, decidi confeccionar um modelo de calça bem bacana. Encontrei um tecido listrado interessante, comecei a produzir e vender essas calças, e acabei me envolvendo na área de moda.

Ainda na faculdade, fui percebendo que esse não era o meu verdadeiro caminho. Enquanto continuava estudando direito, trabalhei em uma confecção especializada em tecidos pintados à mão, fiquei lá 10 anos. Depois disso, tive uma empresa de uniformes, com uma sócia, além de criar figurinos para teatro.

FY: E como surgiu a oportunidade de trabalhar com a marca Absolutamente Necessaire?

Cristiana: A Absolutamente Necessaire surgiu por circunstâncias do destino. Uma amiga minha já possuía essa marca, que se concentrava principalmente na produção de nécessaires e outros acessórios para bebês, utilizando o matelassê. Porém, em determinado momento, acabei assumindo completamente a empresa e isso já faz vinte e dois anos.

Decidi então focar exclusivamente na produção de acessórios, motivada pela identificação que tive com essa área e pelo sucesso dos produtos. Hoje, além de atuar no varejo, também desenvolvemos produtos e coleções para marcas grandes, o que se tornou uma das principais atividades da marca.

Tenho uma equipe de cerca de dez pessoas. A maioria da produção é realizada internamente, permitindo manter um maior controle sobre a qualidade dos produtos. Recentemente, mudamos a sede da empresa para Barra Funda, pois precisávamos de uma estrutura maior para acomodar nossas operações. Realizamos uma grande reforma no espaço para personalizá-lo e criar um ambiente que refletisse a identidade da marca.

FY: Você também está envolvida no projeto Absoluta + RI, ao lado de Renato Imbroisi. Poderia nos contar um pouco sobre essa parceria?

Cristiana: Eu conheci Renato Imbroisi nessas feiras de design e fiquei encantada com o trabalho dele. Em um determinado dia, falei que queria trabalhar com ele. Foi então que ele me convidou para ir a Brasília e conhecer algumas mulheres que faziam bordados. Começamos então a trabalhar juntos, já faz cerca de vinte anos, em projetos de resgate do artesanato.

FY: Pode nos contar sobre o projeto que desenvolvem no Muquém?

Cristiana: Um dos projetos que se destaca é o realizado com a comunidade de artesãs do Muquém, um distrito da cidade de Carvalhos, em Minas Gerais. Renato atua nessa região há mais de 35 anos. Lá, o trabalho é um pouco diferente do que realizamos em outras comunidades, pois as artesãs trabalham com tecelagem, utilizando o tear, e produzem sob encomenda. Através dos meus contatos com empresas, principalmente as grandes, buscamos fazer essa ponte.

Uma das formas de colaboração é aproveitar os resíduos dessas empresas, como sobras de tecido, e levá-los para lá, para que as artesãs possam utilizar no tecimento. A criação é sempre em conjunto, valorizando a participação das artesãs. Ouvimos atentamente o que elas têm a dizer, em qualquer comunidade que chegamos. O processo é colaborativo, construímos juntos. É gratificante testemunhar as artesãs descobrindo seus talentos, como uma que nunca havia desenhado e agora cria desenhos incríveis.

Há cerca de 2 anos, conseguimos ocupar uma escola cedida pela prefeitura, que se tornou a escola de artesanato do Muquém. Nesse espaço, oferecemos diversos cursos para a comunidade local, abrangendo áreas como música e tecelagem.

FY: Além do Muquém, você mencionou outros trabalhos com comunidades. Poderia nos contar mais sobre essas experiências?

Cristiana: Sim, além do Muquém, já realizei um projeto com refugiados em Portugal, outro com pessoas privadas de liberdade no presídio de Tremembé, interior de São Paulo. Tenho um projeto em Moçambique, só para citar alguns entre tantos.

Essa é uma área bastante vasta em que me envolvi ao longo do tempo. Hoje em dia, diria que meu tempo é bem dividido entre o Absoluta + RI e as atividades da Absolutamente Necessaire. Cada experiência é única, e procuro sempre estar envolvida na parte comercial desses trabalhos com os artesãos. Afinal, não adianta termos produtos bonitos se não tivermos onde vendê-los. Após termos os produtos prontos, faço um esforço enorme para ajudar nas vendas. Procuro unir o artesanato a grandes marcas, para que elas entendam a importância disso e as pessoas possam valorizar o trabalho artesanal.

FY: Como surgiu a parceria com Fernanda Yamamoto?

Cristiana: A Fernanda tinha vontade de trabalhar com Imbroisi e decidiu procurá-lo. Então, ela e sua equipe viajaram pro Muquém para conhecer de perto o trabalho desenvolvido lá. Eles viram todas as amostras de tecidos e entenderam o processo de produção. A partir desse momento, começaram a pesquisar e experimentar fios diferentes, que não eram usualmente utilizados na comunidade, para criar tecidos em tear manual feitos pelas artesãs. Esses tecidos foram incorporados em algumas peças da coleção que foi apresentada no último São Paulo Fashion Week. Eu tive a honra de participar do desfile, apresentando um look feito com esse material. Foi uma oportunidade incrível para ambas as partes e muito gratificante ver o resultado na passarela

FY: O que você vê em comum no seu trabalho e no trabalho da marca FY?

Cristiana: Fernanda Yamamoto é muito generosa com sua equipe. Ela compartilha a criação, dando oportunidades para aqueles que trabalham com ela e permitindo que sigam seus próprios caminhos. Ela confia neles. Eu também tenho essa abordagem em minha empresa. Além disso, assim como eu, Fernanda tem um enorme respeito pelo artesanato e reconhece o seu valor. Outro ponto em comum é o reaproveitamento de materiais. A coleção das ourelas de tecidos, por exemplo, tem muito a ver comigo e com o trabalho do Muquém, onde podemos reaproveitar tudo. Colocamos os resíduos no tear e eles se transformam em tecido. É um lugar onde nos encontramos e onde essa conexão aconteceu.

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